domingo, 14 de novembro de 2010

A verdadeira generosidade

Na era da informação, falta conhecimento e reflexão. Recebemos todos os dias milhares de notícias, conceitos e opiniões que, fragmentados com a própria repetição, acabam afastando os indivíduos da experiência que é tomar consciência de si mesmo e dos outros.

Generosidade é conhecida como a virtude que uma pessoa ou o animal tem quando acrescenta algo ao próximo. É quando o indivíduo que dá algo a alguém tem ou não o suficiente para dividir. São consideradas pessoas generosas as que se sentem bem em dividir alguma coisa com seu próximo, sem esperar nada em troca.

Segundo René Descartes, a generosidade é apresentada como uma despertadora do real valor do “eu” e, ao mesmo tempo, como mediadora para que a vontade se disponha a aceitar o concurso do entendimento, acabando assim a causa do erro. Neste caso, a generosidade, como uma forma de sabedoria, exerce a condição de mediação entre virtude (vontade) e conhecimento (entendimento).

Para Descartes, o conhecimento da natureza humana é fator de suma importância para a prática da vida. Desse modo, os erros decorrem da ignorância do “eu” a respeito de sua própria natureza e do seu modo de ser e agir. A generosidade é o conhecimento da resposta a uma das mais importantes questões que o "eu" pode propor: por que deve ele estimar-se ou desprezar-se? A resposta é pela felicidade que se dá pelo conhecimento da verdade, isto é, da sabedoria. Portanto, é a mediação efetiva entre a vontade e o entendimento, pois o "eu" alcança o grau máximo da sabedoria, isto é, a ciência da moral.

Porém, o real conceito de “generosidade” vem sendo estudado e debatido por diversos estudiosos. André Comte-Sponville, autor do livro Pequeno Tratado das Grandes Virtudes, por exemplo, coloca-nos diante da possibilidade de examinar miudamente, dentre outras virtudes, o sentido de generosidade.

Quem nunca associou generosidade à solidariedade, justiça, amizade e ao amor? Vivemos atualmente em um ambiente repleto de idéias competitivas, onde a vitória de um torna-se necessariamente a derrota do outro, e nada se justifica sem compensação. O filósofo em questão sustenta a tese que dentre as virtudes a generosidade é fundamentada na falta de interesse em qualquer retribuição.

Comte-Sponville defende o seu ponto de vista fazendo uma comparação entre a generosidade e as virtudes que costumam ser facilmente confundidas com ela. Para ele, solidariedade é “um estado de fato antes de ser um dever; depois um estado de alma (que sentimos ou não), antes de ser uma virtude ou um valor”. Desse modo solidariedade pressupõe coesão e interdependência de interesses. Nos movimentos políticos, tantos os integrantes de um partido como os seus oponentes são solidários entre si, isto porque possuem os mesmos interesses. Dessa forma, “ao defender o outro nada mais faço do que defender a mim mesmo”. O que leva crer que o procedimento tem muito mais a ver com egoísmo do que com solidariedade.

Luiz Renato D’Agostini e Ana Paula Pereira Cunha seguem a mesma linha para demonstrar a diferença entre ser generoso e ser solidário. “O comportamento solidário já estava presente no ser social que evoluiu para humano. Já generosidade é manifestação genuinamente humana, essencial para a construção da humanidade. A diferença entre solidariedade e generosidade é semelhante àquela que existe entre cooperar e doar muito grande”. Então, não é incomum a generosidade estar presente em algum ato solidário. Contudo, é mais comum encontrar solidariedade entre humanos com intenções [des]humanas.

Para Comte-Sponville, ser generoso, por exemplo, é diferente de ser justo. A justiça argumenta, trata de atribuir a cada o que é seu, mas generosidade cuida de oferecer o que é de quem oferece e falta ao outro. Justiça está ligada ao que é intelectual, objetivo e universal, e a generosidade é mais espontânea, subjetiva e afetiva. Logo, generosidade é agir não em razão de uma determinada lei.

Há também os que confundem amor com generosidade. Ser generoso é exatamente dar sem amar. Só precisamos de generosidade na falta de amor, pois ela depende da vontade e o amor não. A generosidade, segundo o autor, é a virtude do dom, pode ser o dom do dinheiro ou o dom de si mesmo. A verdadeira virtude é colocada em prática quando o indivíduo oferece o que pode faltar, ou então aceita dispor apenas do necessário, aumentando as possibilidades de outros usufruirem o essencial.

Generosidade não deve ser um objetivo de vida, mas sim consequência de reflexão da sociedade desigual. O anonimato é a forma ideal de demostrar esse nobra sentimento, sem a rotulação de um cidadão politicamente correto.

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